EXPOSIÇÃO INDIVIDUAL DE ANA GODOY
Reflexão sobre mãe, lar e valores socioculturais.
Realizada entre 1º a 11 de maio de 2014.
Local: CCC – Centro de Criatividade de Curitiba, Curitiba- PR
Curadoria: Pedro Moreira.
ARTE, CULTURA E DIVERSIDADE
Por Pedro Moreira*.
Maio, abaixo do equador é o tempo dos casamentos, das festividades familiares e da mãe. Tempo afetivo, do amor, doação. É o período da entrega, de acender o fogo sagrado e realizar o lar com a esperança de sempre perpetuar, em se realizar um mundo feito na gentileza, na educação, no sensível.
Ana Godoy apresenta a intervenção do Encontro e do Abandono. Ela nos mostra que muitos esforços foram perdidos no caminho da plena alegria. As famílias contemporâneas, múltiplas e diversas querem retomar esse aconchego delicado das relações do amor em suas casas, no mundo social, mas algo aconteceu que repentinamente, tornaram-se as casas pesadas, definidas. Casas que não se sustentam, estão presas e, ao mesmo tempo, se desestruturam na ordem errática do fragmentário contemporâneo. Casas de ferro, gradeadas e alarmadas. Alguém dentro, preso.
A escultora faz perguntas junto com os visitantes.
Estão em suspense, fincadas em um tecido delicado, de argolas, uma malha fina que parece água borbulhante, mas são correntes. Nesse terreno estranho estão fixas as suas palafitas. São lares que poderiam ser belos, no vale dos seres humanos. Mas algo fere a nossa imaginação. Há cores e brilhos, e ao mesmo tempo muita tristeza na vila das pessoas. A artista faz perguntas, ela quer saber por que é assim esse mundo. Há grande percepção estética em suas formas, e uma técnica apurada, materiais maravilhosos que nos contam alguma história trágica. Parece dizer mais que banalização da vida. Parece que entramos em uma armadilha. Uma emboscada para a percepção, para o entendimento.
Há um conjunto de bronzes nas vitrinas. Vemos bebezinhos em vasos, estão no mundo interno de mamães. A gente os vê lá, intocáveis, uma promessa. São impressionantes, incríveis diminutos que se movem ou vão se mover.
Na estrutura vazada da sala de exposições, lindos bebês coloridos descem por uma claraboia iluminada de azul. Estão na bolsa, e nela descansam no âmnio transparente com seu cordão. Quem vê sabe que um lhe pertence. Está na memória, incluindo o som intermitente entre choro e riso.
Todos juntos. Aguardam entre céu e terra a passagem para o mundo terreno. Pode-se dizer esperança.
A artista quer que reflitamos sobre a vida. O lugar do humano. Que pensemos sobre o abandono do sensível, da omissão, do silêncio. A resignação embrutecida no egoísmo dilacerante contra a possibilidade real do amor.
Há beleza em tudo, mas há tristeza.
Uma armadilha: O que fazer? Aceitar a arte, refletir.
*Pedro Moreira da Silva Neto
Mestre em Políticas Públicas e Gestão da Educação, UTP/PR. Atua na área da arte, sendo ator e diretor teatral, professor de Educação Comunitária, Ética e Cidadania. Desenvolve trabalhos em Pedagogia Social Comunitária, atua em educação continuada, liderança, história do caderno escolar, criatividade e artes.
OPINIÃO DA ARTISTA
ENCONTRO DO ABANDONO
Por Ana Godoy.
As obras produzidas abordam temas bastante recorrentes nos dias de hoje, como valorização da vida, preservação do meio ambiente, nascimento e morte.
Nas obras Baby Bag e Mórulas são tratados com mais ênfase temas como gestação, aborto e o descarte de bebês realizados pelos próprios genitores que se permitem decidir sobre a vida dos recém nascidos. Estas crianças são descartadas por vezes ainda no útero, quando “Mórulas”, ou abandonadas dentro de sacos de lixo.
Eventualmente, todos ouvem e se escandalizam com a ocorrência destes fatos, mas ainda assim parecem estar distante de cada um. E a apresentação deste trabalho estimula a reflexão dos expectadores da arte sobre este tema, aproxima indivíduos das mais variadas classes sociais à esta temática e grave problema social.
A vida é o principal direito humano. É importante despertar a consciência de que a vida humana deve ser protegida, e respeitada e que os problemas sociais estão mais próximos de nós do que imaginamos.
As obras entituladas “Mórulas” referem-se ao início da vida, à primeira fase do desenvolvimento embrionário, quando a partir de uma única célula inicia-se um processo de segmentação múltipla que sucessivamente culmina em uma acumulação esférica de células: as mórulas – o início da formação de um ser vivo. As mórulas, do latim amoras, positivam a vida, manifestam o desencadeamento do ser em busca da confirmação de sua própria existência. As esferas espalhadas pelo chão representam os abortos realizados.
As “Conchas” e “Ecografias” de bronze e contendo bebês expressam a necessidade de proteção, crescimento, divisão, organização, maturação e especialização. As estruturas onde se depositam os pequenos fetos são úteros, responsáveis pela proteção e manutenção da vida em gestação.
No sentido ampliado, os trabalhos tratam da importância da divulgação dos problemas sociais, vida e ambiente e do papel da arte nesta reflexão, o que construímos pra nós mesmos. “Palafitas”, casas, moradias ou prisões, o que nos protege ou nos aprisiona, em que consiste nossa fortaleza ou nossa fragilidade.
Ana Godoy, Maio de 2014